segunda-feira, 19 de março de 2012

Esquema, norma, uso... oi?

É, moçada... vamos dar comida chique aos peixes, hoje. Mas vamos fazer essa passagem em dégradé, que é pra não assustar. ;-)


Saussure andou falando por aí que a Fala é o lado individual da Linguagem, e que a Língua é o lado social dela, não foi? Então, a gente consegue chegar à mesma conclusão que Barthes: "a Língua é o produto e o instrumento da Fala ao mesmo tempo". Sim, porque a Língua passa a existir só quando o indivíduo aprende a falar, e a Fala só existe quando há a Língua. Confuso? Naaaão... aí dentro você entendeu, talvez só não consiga racionalizar uma explicação. ;-)

Tem um cara de nome esquisito, o Hjelmslev (se alguém aí souber a pronúncia disso, POR FAVOR, me ensina!), que achou essa teoria de Saussure interessante e verídica, porém meio basiquinha demais. Foi dar uma de gostoso letrado (e o pior é que ele não era sofista) e formalizou a coisa toda recategorizando os termos. Foram criados os planos: esquema, norma e uso. Bora lá.

- Esquema: é exatamente o que Saussure chamava de Língua, em seu sentido mais rigoroso. É a língua em sua forma mais pura. São as convenções da Linguagem, a gramática, a ortografia.

- Norma: é a língua como forma material (disse Barthes). Tipo: o 'r' na palavra remédio tem pronúncia diferente do 'r' da palavra arábe. Sacou?

- Uso: é a língua sob influência dos hábitos regionais. Voltando num exemplo que eu já dei, é a diferença entre o 'porta' falado em Piracicaba e o 'porta' falado em Belo Horizonte. A palavra é a mesma, a grafia dela é a mesma, mas a pronúncia é "batizada" dependendo da região.

"Mas, poxa, eu já tinha sacado a dicotomia saussuriana! Por que diabos esse Hjemlfmlfmlf da vida foi inventar essa fuzaca??" Eu pensei a mesma coisa, mas a explicação dele, academicamente, permite um aprofundamento maior - e isso, pra quem resolver partir pra essa área maluca do conhecimento humano, é luxo puro! ;-p

Por um lado, Saussure dizia que Fala e Língua se complementam, se justificam, né? Hjelmslev também explica sua teoria, assim:
- a norma determina o uso e a fala;
- o uso determina a fala, mas é determinado por ela também;
- o esquema é determinado pela fala, pelo uso e pela norma.

É bagunçado, mas você há de admitir que faz sentido. Agora você vai sacar que essa conceituação toda veio sendo resumida até quase a dicotomia de Saussure. Para Hjelmslev, a norma é uma abstração do método, e a fala é simplesmente a concretização; isso forma uma nova dicotomia, a Esquema/Uso, que pode substituir a Língua/Fala de Saussure, porém de maneira mais formal. Isso porque Hjelmslev só trocou "língua" por "esquema", mas ao trocar (e conceituar) a "fala" por "uso", deu um sentido muito mais social ao termo. Assim a parte substancial passa para a fala, e o diferencial para a língua.

Talvez isso não faça sentido agora, mas daqui a pouco vamos ver uma contradição provocada pela dicotomia saussuriana que a dicotomia hjelmsleviana corrigiu com essa mudança.

Pesou? Também achei. Vamos parar por aqui? ;-)

Análise do livro "Elementos da Semiologia", de Roland BARTHES. 2006, 18a. ed..

quarta-feira, 7 de março de 2012

Língua e Fala: a dicotomia saussuriana


Com um título desses, metade desanima de continuar a leitura. Eu desanimaria uns tempos atrás! Mas hoje, coisa que gosto é passar mais de meia hora em cima dum único parágrafo, só pra entender o que diachos ele está querendo dizer! Semiótica é assim! Ói que bão! ;-D

Até aqui, a gente só desbravou a INTRODUÇÃO do livro de Barthes. Agora é que o bicho vai começar a pegar. Diliça! E hoje a gente começa com o conceito de Língua vs. Fala de Saussure.

Pra ele, a Linguagem é uma verdadeira zona: inclassificável, excêntrica, estrambólica porque ela compõe um processo físico, fisiológico, psíquico, individual e social. E de fato: como classificar uma fuzaca feito essa. né? SÓ QUE... só que, se a gente isola o conjunto de convenções que a forma (logo, a parte social), temos a língua - um "objeto social" (como Barthes expõe) perfeitamente classificável. E nisso, a fala se torna a parte individual da linguagem.

Barthes jogou matemática onde antes só se via português e disse o seguinte: "A língua é então, praticamente, a linguagem menos a fala". Tá odiando o coitado mais ainda depois dessa, né? Faz isso não, o cara "tem as manha", é inteligente por demais. Afinal, um abestalhado jamais uniria português, matemática e semiótica numa fórmula que fizesse algum sentido! ;-p Bora continuar.

Então já entendemos: a língua é a parte social da linguagem, é uma espécie de "contrato coletivo" que todos os indivíduos devem aceitar para que consigam se comunicar. É social porque uma pessoa não pode criar uma língua sozinho - sozinho ninguém se comunica (ok, deixem a oração fora do assunto). Igualmente, essa pessoa não consegue modificar uma língua por conta própria e sair por aí se fazendo entender. A língua é coletiva e pronto.

"Ah, mas e as diferenças dum cara que mora no interior de São Paulo e fala o R de Piracicaba e do outro que mora em BH e fala um R menos puxado"? Ahh... aí, caríssimo, é a FALA. ;-) E a fala é um processo individual, mesmo. Se eu cismar, posso sair por aí falando "geladeira" ao invés de "geladêra" como a maioria das pessoas fala. Mas a palavra é conhecida na minha língua, na sua, de todo mundo; é um signo socialmente reconhecido (a gente vai falar sobre signos mais pra frente, não se preocupe). Agora, a maneira como vou pronunciá-la é decisão individual minha, é minha decisão sobre a maneira como vou falar.

Tranquilo até aqui, né? A Língua é a parte social da linguagem; a Fala é a parte individual. Então, a fórmula de Barthe está certa (dentro do conceito de Saussure): língua+fala=linguagem.

Apesar de a Fala ser um ato individual, ela não é aleatória: ela é uma combinação de signos da Língua, e esses signos são idênticos ao longo do discurso. Pra ficar mais fácil de entender: duas pessoas conversando na mesma língua. :-) Sacou? Considerando que as palavras são signos (no sentido de símbolos, grosseiramente falando), as palavras usadas por essas duas pessoas são as mesmas, não são? Pois então. Elas estão usando de um ato individual (que é a Fala) para se comunicarem através de um ato social (que é a Linguagem), que tem seus signos já estabelecidos através daquele tal de "contrato social" que falei ali em cima. Resumindo: estão usando o mesmo conjunto de signos, signos idênticos, para se comunicarem.

Podiam ser duas pessoas conversando em línguas diferentes? Uai... podia. Mas não ia sair nada disso aí. Eu, pelo menos, não consigo imaginar um chinês dando "bom dia" prum alemão e esse alemão não pensar que o chinês estava mandando ele ir à ***********. -.-

Tem bem mais sobre Língua, Linguagem e Fala, mas vamos ficando por aqui por hoje. "Devagar e sempre", já dizia o Rub... ahn... TARUGO! Tarugo, isso mesmo. Tarugo.

C'ya!

Análise do livro "Elementos da Semiologia", de Roland BARTHES. 2006, 18a. ed..